terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

S/T I


É no intenso cheiro de madeira desta casa antiga que agora mergulho. Acompanham-me as memórias dos risos perdidos da criança que voava de braços abertos sobre o alto capim de longínquas terras. “Anda, anda, vem comigo!”, gritava, estendendo-me a mão, “Vamos apanhar o sol, anda!”. O vento sorria, então, procurando entrar naquela corrida. E transformávamo-nos em barcos-memórias naquela ondulação feita de ondas amarelas e verdes. Éramos invadidos pelo forte cheiro da terra ainda recentemente encharcada, fruto de um qualquer choro divino de comoção por aquela navegação ingénua, pura.

Plim… plim…

A gota que agora cai da velha e bolorenta torneira desperta-me. Observo as tábuas velhas que choram a ausência de pequenos passos. Uma formiga procura vencer aquela fenda, pequena, agora abismo. “Anda, anda, vamos apanhar o sol, anda!!”. O sorriso avermelhado com sabor a laranja do sol invade, aos poucos, este espaço. Crepita ao acariciar a lareira. Armstrong vai acompanhando esta doce intromissão de forma dolente, profunda. “What a wonderful world…!”. Apercebo-me, no momento, de um outro som, insistente. A campainha. Levanto-me. “Anda, anda, vamos apanhar o sol, anda!”. Caminho sobre este mar novo, feito de ancestrais respirares-testemunhas. Abro a porta. Falamos o silêncio. Olho o reflexo daquilo que sou, daquilo que quero ser. Está frio. “Anda, anda, vamos apanhar o sol, anda!”

- Entra.

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